Este blog (sobre)viverá da aplicação do Direito ao caso concreto...

25 de junho de 2014

Novas alterações às leis do trabalho em perspetiva

No passado dia 5 de junho, o Governo apresentou na Assembleia da República duas novas propostas de alteração das leis do trabalho, as quais se encontram em fase de apreciação pública até ao próximo dia 27 de junho.

A primeira medida cuida dos seguintes aspetos: (i) a suspensão do período de negociação da convenção coletiva de trabalho; (ii) a redução dos prazos de sobrevigência e caducidade da convenção coletiva de trabalho; e (iii) a possibilidade de suspensão, total ou parcial, da convenção coletiva de trabalho, por acordo entre o empregador e as associações sindicais outorgantes em situação de crise empresarial, por motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos, catástrofes ou outras ocorrências que tenham afetado gravemente a atividade normal da empresa e essa medida seja indispensável para assegurar a viabilidade da empresa e a manutenção dos postos de trabalho.

Devemos referir que a sobrevigência reduz (substancialmente) os efeitos da caducidade de uma convenção coletiva de trabalho, visto que esta continua a produzir efeitos jurídicos após o seu termo para permitir a sua revisão ou substituição sem quebra das condições de trabalho.

As convenções coletivas de trabalho têm assumido uma vocação de perenidade e reforçam a, proclamada, rigidez do regime laboral português. A proposta de lei em apreço pretende diminuir a força vinculativa destes instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho, através da redução do período de sobrevigência e da sua suspensão total ou parcial em situação de crise empresarial.

A segunda medida visa prolongar, até 31 de dezembro de 2014, a suspensão das disposições de instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho (v.g., contratos coletivos de trabalho ou acordos de empresa) e das cláusulas de contratos de trabalho, que tenham entrado em vigor antes de 1 de agosto de 2012 e que disponham sobre (i) os acréscimos remuneratórios devidos por trabalho suplementar superiores aos previstos no Código do Trabalho e sobre (ii) a retribuição do trabalho normal prestado em dia feriado, ou descanso compensatório por essa mesma prestação, em empresa não obrigada a suspender o funcionamento nesse dia.

Numa primeira e perfunctória análise, diríamos que a medida mais inovadora se prende com a suspensão, total ou parcial, de convenções coletivas de trabalho em situação de crise empresarial.

De referir que não se trata de uma solução revolucionária se atendermos a experiências de outros países. Admitimos, aliás, que o legislador tenha buscado inspiração no "procedimento de descuelgue" que vigora em Espanha, o qual consiste num mecanismo extraordinário que permite não aplicar as condições de trabalho previstas em convenções coletivas de trabalho, quando a empresa se encontre numa situação económica difícil. Desde a Reforma de 2012, para além do regime salarial, a possibilidade de não aplicação de uma convenção colectiva de trabalho passou a abranger também as matérias dos tempos de trabalho e da definição das funções atribuídas aos trabalhadores.

Em suma, estas medidas visam transformar as convenções coletivas de trabalho em instrumentos de adaptabilidade da legislação laboral às necessidades das empresas e dos setores de atividade. Cumpre aguardar pelo debate durante o período de apreciação pública e pelos seus resultados.

Nota: artigo publicado no Jornal OJE de 19.6.2014.

As propostas de lei podem ser consultadas aqui e aqui.

O eterno problema laboral dos contratos de prestação de serviço

A questão de saber se uma determinada relação profissional está abrangida por um contrato de prestação de serviços ("recibo verde") ou por um contrato de trabalho será, porventura, um dos temas mais debatidos na jurisprudência laboral.

Propomo-nos fazer um resumo de acórdãos recentes sobre este tema.

O Supremo Tribunal de Justiça (STJ), no acórdão de 21.5.2014, cuidou de um "contrato de avença" e considerou-o como um contrato de trabalho, visto que: (i) o prestador da atividade estava inserido na estrutura administrativa, organizativa e hierárquica do beneficiário; (ii) o beneficiário da atividade fornecia os instrumentos de trabalho; (iii) a atividade era prestada nas instalações do beneficiário; (iv) o prestador de serviços recebia uma contrapartida certa e regular; (v) o prestador de serviços cumpria um horário de trabalho e gozava anualmente férias; (vi) o prestador de serviços exercia funções para o beneficiário de forma continuada, permanente e duradoura (no caso três anos e seis meses). Para o STJ não assumiram relevância decisiva os seguintes factos: (i) não pagamento dos subsídios de férias e de Natal; (ii) emissão de recibo verde com a menção "consultor"; (iii) sujeição a IVA dos honorários recebidos.

No acórdão de 14.5.2014, o STJ apreciou, por seu lado, o caso de um "abastecedor de combustíveis" e considerou não existir uma relação laboral, visto que: (i) a remuneração do prestador de serviços era fixada em função dos litros de combustível vendidos, sem qualquer componente fixa; (ii) o prestador de serviços podia fazer-se substituir por outra pessoa nas suas ausências, sem que tivesse sido provada a necessidade de consentimento do beneficiário; e (iii) não foi provado o exercício do poder de disciplina e de conformação da atividade pelo beneficiário. Segundo o STJ, o facto de a prestação dos serviços decorrer nas instalações do beneficiário não é incompatível com a existência de um contrato de prestação de serviços, nomeadamente quando nesse local se encontram os equipamentos indispensáveis para o exercício da atividade (no caso, tratava-se de um posto de abastecimento de combustível).

Por fim, no acórdão de 19.5.2014, o Tribunal da Relação do Porto (TRP) tratou o caso de uma médica que exercia funções na área da cirurgia capilar e da estética corporal numa clínica e deliberou não existir uma relação laboral, ainda que: (i) a atividade fosse remunerada com uma quantia certa por cada dia de atividade; (ii) a prestadora de serviços devesse iniciar a sua atividade à hora marcada pelo beneficiário com os seus clientes; (iii) a atividade fosse prestada nas instalações do beneficiário. Com efeito, o TRP considerou que (i) a remuneração era fixada em função do resultado e não do tempo de trabalho, (ii) a atividade médica em apreço exigia a organização de meios materiais e humanos disponíveis na clínica, (iii) a prestadora de serviços podia sair das instalações do beneficiário logo que as intervenções marcadas com os clientes estivessem terminadas, e (iv) a prestadora de serviços recusou-se a cumprir determinadas tarefas, sem que o beneficiário da atividade se tivesse oposto.

Pelo exposto, diríamos que este tema tem diversas zonas cinzentas e, como tal, não é possível, de forma abstrata e de "regra e esquadro", destrinçar "a priori" as atividades que podem ser prestadas licitamente ao abrigo de um contrato de prestação de serviços. A matéria da qualificação do contrato exige uma ponderação global de todas as circunstâncias do caso.

Por esse motivo, a "novíssima" ação especial para o reconhecimento da existência de contrato de trabalho, criada em agosto do ano passado, de cariz oficioso, pode ser um foco de litigância laboral, em muitos casos, desnecessária e, quase sempre, onerosa para as empresas e para os trabalhadores.

Nota: artigo publicado no Jornal OJE de 17.6.2014.

6 de junho de 2014

O direito à progressão na carreira à luz do recente Acórdão do STJ n.º 7/2014

No passado dia 2 de Junho, foi publicado, no Diário da República, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) n.º 7/2014 (Melo Lima), o qual cuidou do direito à progressão na carreira nos casos de suspensão do contrato de trabalho.

Segundo o STJ, as regras de progressão na carreira dependem de acordo entre empregador e trabalhador ou de disposição de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho. Por outras palavras, a lei tutela a irreversibilidade da categoria profissional (com algumas exceções), mas deixa a regulação da progressão na carreira profissional à autonomia privada (individual ou coletiva).

Esta questão deve ter em conta o interesse na realização pessoal do trabalhador e o reconhecimento profissional, mas igualmente deve considerar a efetividade de funções, a produtividade e a experiência profissional.

Assim, decidiu o STJ:

I - A interpretação das cláusulas de instrumentos de regulamentação coletiva obedece às regras atinentes à interpretação da lei, consignadas, em particular, no artigo 9.º, do Código Civil, visto tais cláusulas serem dotadas de generalidade e abstração e serem susceptíveis de produzir efeitos na esfera jurídica de terceiros.
II - Na lei laboral ordinária inexiste qualquer norma que imponha aos empregadores o estabelecimento de regras de progressão na carreira dos trabalhadores, sendo o seu dimensionamento e consagração, em princípio, objeto de regulamentação coletiva.
III - Respeita o princípio da proporcionalidade a norma constante do AE TAP/SITEMA que, reconhecendo embora ao trabalhador o direito à progressão na carreira e à evolução na linha técnica, subordina -o a critérios de mérito, antiguidade e de efetividade, reconhecendo -se como determinante a experiência do trabalhador na função.
IV - A lei fundamental impõe que a lei ordinária crie condições adequadas ao exercício de funções sindicais e à sua proteção; todavia, dentro dessas formas de proteção não se enquadra a da progressão na carreira, donde não é por via do estabelecimento, pela contratação coletiva, de regras que, para essa progressão, pressupõem o efetivo exercício de funções - a par da avaliação do mérito - que o direito sindical previsto no artigo 55.º, n.º 6, da Constituição da República Portuguesa, é afetado ou violado.



Contrato de trabalho com pluralidade de empregadores

Paralelamente ao modelo tradicional de contrato de trabalho (empregador-trabalhador) é possível celebrar contratos de trabalho com uma pluralidade de empregadores. Com efeito, o trabalhador pode obrigar-se a prestar a sua atividade a vários empregadores, desde que sejam cumpridos os seguintes requisitos essenciais: (i) deve existir uma relação societária de participações recíprocas, de domínio ou de grupo entre os empregadores (por exemplo, as empresas A e B pertencentes ao grupo de empresas C contratam o trabalhador X para desempenhar as funções de paquete) ou, em alternativa, os empregadores devem ter estruturas organizativas comuns (por exemplo, a empresa D dedica-se à assessoria informática e a empresa E prossegue a atividade de contabilidade; entre estas empresas não existe qualquer relação societária, mas partilham o escritório e os respetivos equipamentos e decidem contratar o trabalhador Y para a atividade de rececionista); (ii) o contrato de trabalho deve ser celebrado por escrito e deve conter a identificação, assinaturas e domicílio ou sede das partes, a indicação da atividade do trabalhador, do local e do período normal de trabalho e a indicação do empregador que representa os demais no cumprimento dos deveres e no exercício dos direitos emergentes do contrato de trabalho.


A violação dos requisitos essenciais desta modalidade contratual constitui contraordenação grave punível com coima e confere ao trabalhador o direito de optar pelo empregador ao qual fica vinculado.


De referir que caso o contrato não tenha sido celebrado por escrito, compete ao trabalhador alegar e provar a existência de uma relação de subordinação jurídica com os diferentes empregadores [Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de Justiça de 29.2.2012 (Gonçalves Rocha) e Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 19.6.2013 (Paula Sá Fernandes)].


Trata-se de um importante instrumento de mobilidade de trabalhadores nos grupos de empresas e de partilha de custos laborais. Todavia, deve ter-se presente que os empregadores são solidariamente responsáveis pelo cumprimento das obrigações decorrentes do contrato de trabalho, cujo credor seja o trabalhador ou terceiro. Por outras palavras, cada empregador responde pela prestação integral em dívida, embora tenha direito de regresso contra cada um dos restantes empregadores na parte que a estes compete (por exemplo, o trabalhador Y tem direito a uma retribuição base de € 800,00; caso o salário não seja pago, o trabalhador pode demandar a empresa D e exigir a totalidade do crédito; depois de pagar, a empresa D pode exigir da empresa E a parte que lhe compete: € 400,00).


Ainda sobre a mobilidade de trabalhadores entre empresas, podem referir-se os seguintes instrumentos laborais: (i) cedência ocasional de trabalhadores; e (ii) cessão da posição contratual de empregador.


A cedência ocasional de trabalhadores consiste na disponibilização temporária de trabalhador, pelo empregador, para prestar trabalho a outra entidade, a cujo poder de direção aquele fica sujeito, mantendo-se o vínculo contratual inicial. A cedência não pode exceder um ano, embora possa ser renovada por iguais períodos até ao máximo de 5 anos.


Por seu lado, a cessão da posição contratual tem sido admitida no âmbito laboral, embora não se encontre expressamente prevista [Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 10.10.2013 (José Eduardo Sapateiro)]. Assim, o empregador pode transmitir a terceiro a sua posição contratual, desde que o trabalhador, antes ou depois da celebração do contrato, consinta na transmissão. A cessão da posição contratual distingue-se da cedência ocasional por ser definitiva.


Em suma, a legislação e a prática laboral têm desenvolvido modelos contratuais para fazer face às formas cada vez mais complexas e diversificadas de organização empresarial. Nesse sentido, justifica-se uma análise e ponderação atempadas do modelo contratual mais adequado às necessidades empresariais e aos trabalhadores.


Nota: artigo publicado no Jornal OJE de 3.6.2014.

As “viaturas de serviço” são retribuição?


Em muitas empresas os trabalhadores circulam com viaturas do empregador ou por este disponibilizadas. Podemos configurar diversas possibilidades: (i) a viatura é atribuída a um trabalhador para uso exclusivamente profissional (por exemplo, para a distribuição de produtos do empregador); (ii) o empregador organiza uma "pool de viaturas" e decide a atribuição temporária de viaturas aos trabalhadores em função das necessidades de serviço; (iii) a viatura é atribuída para uso profissional e pessoal (por exemplo, o trabalhador tem autorização do empregador para utilizá-la aos fins de semana e feriados e nas férias); (iv) a viatura é atribuída para fins exclusivamente profissionais, mas o trabalhador utiliza-a esporadicamente para fins pessoais (por exemplo, levar os filhos à escola).

O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) de 30 de abril de 2014 cuidou da questão de saber se a atribuição de uma viatura para uso exclusivo do trabalhador, nomeadamente nas deslocações da sua residência para o local de trabalho, nos fins de semana e férias, constituía uma prestação remuneratória em espécie.

Em primeira instância, o uso pessoal da viatura atribuída ao trabalhador foi considerado como tolerância do empregador.

Ao invés, o Tribunal da Relação deliberou que a "atribuição da viatura automóvel, com todas as despesas inerentes pagas, integrava a retribuição" do trabalhador, visto não se verificar qualquer ato de tolerância. Segundo o Tribunal da Relação, a ausência de fiscalização da utilização da viatura não consubstancia um ato de mera tolerância do empregador, mas uma situação de desleixo. Para este tribunal, a tolerância exige "alguma consciência do que se tolera".

Na mesma linha e seguindo uma corrente jurisprudencial consolidada, o STJ considerou que "a atribuição de veículo automóvel, com despesas de manutenção a cargo do empregador, para o serviço e uso particular do trabalhador, constitui ou não retribuição, conforme se prove que o empregador ficou vinculado a efectuar essa prestação ou a referida atribuição configura um acto de mera tolerância", respetivamente.

Recorde-se que, no caso em apreço, o empregador atribuiu ao trabalhador o "direito de utilização do veículo na sua vida particular, incluindo em fins-de-semana e férias, e ao suportar os respectivos encargos, designadamente com a sua manutenção, seguros, portagens e combustível, ficou vinculada a efectuar, com carácter de obrigatoriedade, essa prestação".

Ainda de acordo com o STJ, a atribuição do direito de utilização de uma viatura com estas condições constitui "uma prestação em espécie com carácter regular e periódico e um evidente valor patrimonial, que assume natureza de retribuição".

O afastamento do regime retributivo dependia da alegação e prova pelo empregador de que o uso do veículo automóvel era uma "mera liberalidade" ou um "acto de mera tolerância".

A questão da atribuição de viaturas aos trabalhadores produz, ainda, efeitos na definição da base de cálculo da taxa contributiva global – ou incorretamente designada taxa social única (TSU).

Com efeito, as despesas resultantes da utilização pessoal pelo trabalhador de viatura automóvel que gere encargos para o empregador integram a base de incidência contributiva. Considera-se que a viatura é para uso pessoal sempre que tal se encontre previsto em acordo escrito entre o trabalhador e o empregador do qual conste: a) a afetação, em permanência, ao trabalhador de uma viatura automóvel concreta; b) que os encargos com a viatura e com a sua utilização sejam integralmente suportados pelo empregador; c) menção expressa da possibilidade de utilização para fins pessoais ou da possibilidade de utilização durante 24 horas por dia e o trabalhador não se encontre sob o regime de isenção de horário de trabalho. Considera-se, ainda, que a viatura é para uso pessoal sempre que no acordo escrito seja afeta ao trabalhador, em permanência, viatura automóvel concreta, com expressa possibilidade de utilização nos dias de descanso semanal.

Nestes casos, o valor sujeito a incidência contributiva corresponde a 0,75% do custo de aquisição da viatura.

Em suma, é importante que o empregador conheça o regime legal aplicável no momento em que decide atribuir viaturas aos trabalhadores e, desse modo, evite algumas consequências indesejáveis.

Nota: artigo publicado no Jornal OJE de 27.5.2014.

Pactos de não concorrência

O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) pronunciou-se recentemente sobre a possibilidade de renúncia unilateral do empregador a um pacto de não concorrência.

O Tribunal de primeira instância considerou que o objetivo deste tipo de pactos é "servir um interesse específico do empregador". Segundo este tribunal, "no decorrer da relação laboral o prejuízo que o pacto de não concorrência visa acautelar pode variar, aumentando, diminuindo ou tornando-se mesmo inexistente". O empregador pode, assim, perder o interesse em virtude da diminuição do risco de concorrência e, por conseguinte, pode renunciar ao pacto de não concorrência.

Por seu lado, o Tribunal da Relação de Lisboa sustentou que a "possibilidade de desistência unilateral pelo empregador viola a boa fé, consentindo ao empregador a denúncia do pacto quando o trabalhador já sofreu uma limitação na própria liberdade do trabalho, cerceando-se a possibilidade de procurar uma outra ocupação". Deste modo, foi declarada a nulidade da renúncia ao pacto de não concorrência pelo empregador.

Finalmente, no Acórdão de 30 de abril de 2014, o STJ acolheu o entendimento do Tribunal da Relação de Lisboa, embora tenha reconhecido a natureza "controversa" deste tema.

Para o STJ, estes pactos condicionam a liberdade do trabalhador durante o período de não concorrência e "limitam a cabal participação do trabalhador no mercado de trabalho nos antecedentes períodos, assim condicionando a sua possibilidade (e o seu interesse) de procurar/equacionar outras alternativas profissionais e de otimizar a gestão da sua carreira, realidade que se traduz mesmo, com frequência, em situações de perda de oportunidade".

Salvo melhor opinião, este entendimento do STJ não poderá fechar as portas aos casos em que desaparece – ou se reduz fortemente – o risco de concorrência diferencial do trabalhador. Por exemplo, a empresa A contratou o trabalhador X para investigar e desenvolver projetos na área da indústria automóvel; os trabalhos conduziram a uma invenção patenteável; todavia, a empresa B – localizada, por hipótese, no Japão – chegou a idênticos resultados e apresentou antecipadamente o pedido de patente, por exemplo, através do procedimento conduzido pela Organização Mundial de Propriedade Intelectual e reivindicou proteção para Portugal. Fará sentido que, neste caso, o pacto de não concorrência se mantenha em vigor? O trabalhador X só poderá tirar partido da atividade desenvolvida na empresa A se for contratado pela empresa B e, mesmo nesse caso, estaria a trabalhar por conta, sob autoridade e direção do titular do direito de exclusivo.

Os pactos de não concorrência levantam, ainda, problemas relacionados com o valor e momento de pagamento da compensação devida ao trabalhador pela limitação da liberdade de trabalho.

Atendendo ao exposto, é necessário ter particulares cuidados no momento de negociar e celebrar pactos de não concorrência.

Nota: artigo publicado no Jornal OJE de 20.5.2014.