Este blog (sobre)viverá da aplicação do Direito ao caso concreto...

21 de abril de 2013

Cessação do contrato de trabalho: comunicação do empregador e a sua revogação

Em 6.1.1993, o STJ considerou que a denúncia do contrato de trabalho a termo pelo empregador consistia numa declaração unilateral, formal e receptícia que podia ser revogada pelo empregador até ao termo do prazo acordado para a vigência do contrato. Por outro lado, a revogação da denúncia era igualmente uma declaração unilateral receptícia, mas não estava sujeita a forma escrita e produzia efeitos independentemente da vontade do trabalhador. Por curiosidade, foram dados como provados os seguintes factos:
- em 21 de Janeiro de 1985 foi celebrado, entre o Autor e a Ré, um contrato de trabalho a prazo certo de 6 meses e pelo qual aquele se obrigava, mediante remuneração, a prestar, sob autoridade e direcção desta, a função de carteiro, na Central de Correios de Coimbra (documento n.º 1) e que se renovou automaticamente por mais 6 meses;
– por carta registada com aviso de recepção, datada de 8 de Janeiro de 1986 e pelo A. recebida no dia imediato, foi-lhe comunicado que tal contrato, que terminava em 24 de Janeiro de 1986, não seria renovado (documento n.º2); 
– em 22 de Janeiro de 1986, os serviços competentes da Ré escalaram normalmente o A. para o serviço, o que veio sempre a acontecer desde aquela data e até à cessação do contrato sub judice, ocorrida em 21 de Janeiro de 1987 (…) (Cfr. AD, 377.º, pp. 587-589).
Refira-se, aliás, que este entendimento foi seguido noutros Acórdãos de Tribunais superiores (por exemplo, aqui e aqui).
Podia colocar-se a seguinte questão: a comunicação do empregador pode ser revogada unilateralmente, a todo o tempo e ao abrigo da liberdade de forma?
Aquela (aparente) corrente jurisprudencial encontra-se hoje afastada. Vejamos alguns exemplos:
a) STJ (Pereira Rodrigues) 23.11.2011
A revogação da comunicação da não renovação do contrato de trabalho a termo por parte da entidade empregadora terá também que obedecer à forma escrita, por as razões da exigência especial da forma escrita lhe serem aplicáveis (artigo 221.º, n.º 2 do CC).

A declaração de vontade que tem um destinatário torna-se eficaz logo que chega ao seu poder, ou é dele conhecida, e torna-se irrevogável a partir dessa ocorrência (artigos 224°, n° 1, e 230°, n° 1, do CC).
O empregador, que pretenda efectuar a revogação da declaração da caducidade do contrato a termo, carece não só de a fazer por escrito, como também de fazer chegar esse escrito ao trabalhador antes ou ao mesmo tempo que a declaração da caducidade, como sucede, em termos gerais, com a revogação da aceitação ou da rejeição da proposta contratual (artigo 235.º do CC).

b) TRE (João Nunes) 21.02.2013
O despedimento consubstancia uma declaração receptícia ou recipienda que se torna eficaz logo que chega ao poder do destinatário, ou é dele conhecida, sendo a partir desse momento irrevogável, salvo declaração em contrário.
A declaração negocial deve valer com o sentido que um destinatário razoável, colocado na posição concreta do real declaratário, lhe atribuiria.
Constitui um despedimento, por extinção do posto de trabalho, a comunicação enviada pela entidade empregadora ao trabalhador, em 2 de Março de 2009, em que declara que devido a «decréscimo significativo de trabalho o seu posto de trabalho será extinto a partir de 31/03/2009», ainda que a eficácia do despedimento se encontre sujeita a este termo.
A referida eficácia do despedimento só será prejudicada se antes do esgotamento do prazo indicado de aviso prévio sobrevier outra causa extintiva, designadamente a decisão de despedimento por facto imputável ao trabalhador.
Em conformidade com as proposições anteriores, não podia a entidade empregadora, unilateralmente, e por comunicação de 19 de Março de 2009, dar sem efeito a anterior comunicação de cessação do contrato, por extinção do posto de trabalho.
Do facto do trabalhador não ter respondido à comunicação da entidade empregadora de 19 de Março – de dar sem efeito a anterior comunicação, de cessação do contrato em 31 de Março seguinte – e de ter trabalhado até este último dia, não se retira que o mesmo trabalhador aceitou a revogação da comunicação de cessação do contrato que lhe havia sido efectuada em 2 de Março de 2009. 

Neste Acórdão é referida jurisprudência do STJ no que toca à natureza de declaração receptícia da comunicação de despedimento: STJ (Vasques Dinis) 22.10.2008 e STJ (Pinto Hespanhol) 27.02.2008.
Assim, parece resultar dos casos acima referidos que o empregador pode revogar unilateralmente a declaração de cessação do contrato de trabalho, desde que o faça sob a mesma forma e até ao momento em que aquela chega ao poder do trabalhador, ou é dele conhecida. A partir desse momento, a revogação da declaração de cessação do contrato de trabalho só produz efeitos com o consentimento, expresso ou tácito, do trabalhador (visto que a celebração de contrato de trabalho não está, em regra, sujeita a forma escrita).

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